O Falhanço da PS3 salvou a PlayStation

Agora que estamos na reta final da “oitava geração” – no que às consolas diz respeito – um período dominado pela Playstation 4, é uma boa altura para olhar para o passado, não só para recapitular aquilo que a Sony fez de bem, mas para tentar perceber a origem da estratégia que fez com que a companhia japonesa merecesse a confiança dos jogadores ao longo dos últimos anos, coisas que deverá repetir na geração PS5, a nona, e onde se espera uma concorrência mais apertada do que nunca.

Depois de entrar em grande a na indústria com a primeira PlayStation, e de uma PS2 que vendeu mais de 150 milhões de unidades, a Sony pagou o erro da arrogância, sofrendo com um conturbado lançamento de uma terceira máquina, a Playstation 3, cujo falhanço [inicial] viria, argumentamos nós, a forçar a empresa a reajustar a sua estratégia, recuperando com isso a face e permitindo-lhe partir para uma nova geração com as agulhas acertadas.

Relação com os Third Party

Desde a primeira hora, a PlayStation alcançou o sucesso graças a uma saudável relação com os estúdios externos, que lhe permitiu ter não só um imenso catálogo de ofertas, mas também afirmar franquias como Final Fantasy, Tomb Raider, Resident Evil, Metal Gear Solid ou Grand Theft Auto, todos eles com múltiplos sucessos de vendas, embora desconfiemos que o último venda bem em qualquer sistema onde seja lançado, nem que seja num frigorífico.

a PlayStation alcançou o sucesso graças a uma saudável relação com os estúdios externos…

Essa senda manteve-se até ao fim da geração PS2, altura em que os estúdios internos da Sony, todos aqueles que são hoje venerados pelos seus fãs, se limitavam a experimentar com séries animadas, de que são exemplo Ratchet & Clank (Insomniac Games), Sly Cooper (Sucker Punch) ou Jak and Daxter (Naughty Dog). Excepcionalmente tivemos os jogos da série Syphon Filter, os títulos da Team ICO ou Japan Studios, mas todos eles projetos de nicho, sem a relevância de mercado dos anteriores. A grande excepção foi Santa Monica, que apresentou o brilhante God of War em 2005, já numa altura de total domínio da PS2, mas ainda assim, num modelo de ação hack and slash muito diferente da experiência cinemática do GOTY de 2018, e já lá vamos.

Para perceber como a transformação ocorreu, temos de viajar até 2006, altura do lançamento da PlayStation 3, um período de contraciclo da Sony, que não só propôs ao mercado uma consola mais cara do que a concorrência, quando historicamente era ela quem vinha matando os competidores dessa forma, como numa mistura de ambição e arrogância, deu aos produtores um puzzle demasiado complicado para desmontar, o famoso processador Cell, o que acabou por empurrar as melhores versões dos tais jogos third party para a máquina concorrente, a Xbox 360 na altura.

Demorou até que os erros fossem corrigidos, mas foi exatamente por se encontrar, pela primeira vez na história da sua aventura no gaming, entre a espada e a parede, que a Sony mostrou o melhor de si, investindo na simplificação da sua consola por um lado (adeus retrocompatibilidade), e na qualidade dos seus exclusivos por outro. Diria que o ponto de viragem aconteceu em 2009, altura do lançamento de Uncharted 2: Among Thieves (Naughty Dog), Infamous (Sucker Punch) e Killzone 2 (Guerrilla), embora no caso deste último fosse impossível cumprir por completo a expectativa criada pela própria Sony naquele célebre vídeo de anúncio.

Esta mudança para experiências mais cinemáticas continuou ao longo do resto da vida da PlayStation 3, que ainda recebeu jogos como God of War 3 em 2010, Infamous 2 e Uncharted 3: Drake’s Deception em 2011 e culminou naquele que é considerado como a obra-prima da geração, The Last of Us, lançado a 14 de junho de 2013, o mesmo ano da chegada da PlayStation 4.

A Era do For The Players

A PlayStation 4 é a prova de que a Sony aprendeu a lição. A atual consola é também um testemunho de algo que a companhia sempre entendeu muito bem, a importância de acompanhar o crescimento da sua base nuclear, os clientes “pioneiros”, que fizeram o sucesso da Sony no Gaming desde a primeira hora.

A arquitetura da consola é mais simples do que nunca, mérito para o génio de Mark Cerny neste capítulo, não é por acaso que tenha sido ele o homem recrutado para montar a próxima geração de consolas PlayStation, e se há algo que todos os intervenientes da indústria parecem concordar, é na qualidade das experiências first party que a PlayStation 4 nos tem oferecido, muito mais cinemáticas e viradas para um público mais adulto.

Só no ano passado, os estúdios internos da SIE deram-nos um renovado God of War, que mereceu honras de melhor do ano e que percebeu, talvez melhor do que nenhum outro, o que a audiência queria; Marvel’s Spider-Man, o melhor jogo do Homem-Aranha que a Sony encomendou à Insomniac para bater recordes de vendas; e Detroit: Become Human, o culminar da experiência Quantic Dream nas máquinas da companhia.

a concorrência será maior na próxima geração

Em cima de tudo isto, tem na rampa de lançamento jogos como Ghost of Tsushima, uma nova PI da Sucker Punch; Death Stranding, anunciado depois da companhia agarrar Hideo Kojima, de saída da Konami, e claro, The Last of Us: Part II, a ver se a Naughty Dog lhes permite repetir a gracinha, desta feita, com a certeza da compatibilidade com a consola seguinte, a inevitável PlayStation 5.

Os analistas têm razão quando dizem que a concorrência será maior na próxima geração, mas a PlayStation parte numa posição invejável, se mantiver a humildade e a estratégia, não vai fazer a vida nada fácil aos competidores, independentemente da quantidade de nuvens que esses tenham nos céus.


Aníbal Gonçalves é um tipo totalmente desinteressante, mas que tem a sorte de ser apaixonado por coisas super interessantes. Podes segui-lo em @Darthyo

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