Animal Crossing: New Horizons – Review – Numa ilha algures no Oceano Pacífico

Eleva o espírito “good feel” e aspecto “cute” de uma vida simples e feliz em comunidade, com mais ferramentas.

Agora que a série Animal Crossing atinge novos horizontes, traz nessa meta algumas passagens de testemunho. O caso mais visível é a gestão da Nook’s Cranny (uma espécie de mini-mercado), agora a cargo dos cómicos e acolhedores Timmy e Tommy, que nos acompanham sempre de perto em cada deambulação pela loja. Eles são especialistas em números, aquisição de “turnips” – as famosas acções – e produtos exclusivos que todos os dias apresentam. Tom Nook ainda é, no entanto, a personagem central e da qual deriva esta nossa viagem para uma ilha que será alvo de transformação e crescimento a nosso gosto.

É ele quem gere e de certa maneira dá origem a este jogo, por via da empresa Nook Inc (uma nomenclatura que para além de lembrar a palavra Nintendo ainda possui um design inspirado). Ele não só nos vende o acesso à ilha como ainda faculta meios e materiais de construção, desde que receba as “bells” ou “nook miles” (adiante veremos do que se trata). Todos os dias ele dá as boas vindas ao jogador. Tom Nook parece ter visto os seus poderes reforçados em New Horizons, mas há uma nova geração em crescendo. À medida que passamos o tempo na ilha e vamos conhecendo os residentes, descobrimos novos npc’s, como a nova vendedora de “turnips”. Mas também há regressos.

Com novas personagens, New Horizons é também o jogo mais amplo na série, operando mudanças em vários domínios, principalmente na maior autonomia dada ao jogador no processo de construção e modelação da ilha, ao mesmo tempo que exacerba e dá seguimento aos detalhes e aspectos que, embora recebendo influências de outros jogos, sempre foram “sui generis” na manutenção de um sistema promotor da vida em Animal Crossing. É o humor patente nas conversas com os npc’s, as reacções e toda uma acção em tempo real que não só torna agradável como gratificante ver as mudanças implementadas na ilha.

1 O relógio interno da consola permite o desenvolvimento da acção em tempo real. À noite podem ligar a consola, havendo céu limpo, para observar estrelas cadentes. Alguns desejos serão garantidos.

Quem nunca tenha jogado Animal Crossing e tenha curiosidade, só tem que gastar umas boas horas, que nem precisam de ser de enfiada, para perceber o funcionamento do jogo. Os objectivos podem ser concretizados com espaço entre si. Podem até tomar o tempo que quiserem. Embora este seja talvez o Animal Crossing melhor estruturado em termos de progresso, a beleza do quotidiano passado na ilha está em observar como paulatinamente há um crescimento com a chegada de novos habitantes, aparecendo novas casas, a que sucede as singularidades de cada um, com as suas idiossincrasias.

Para lá das metas sociais, com a entrada dos residentes na ilha há uma mudança e transformação. Levará o seu tempo a modelar a ilha na sua completa dimensão, com tantos detalhes que podem ser aplicados na construção das casas, especialmente na dimensão paisagística, através de uma série de serviços e atracções de livre iniciativa e que a longo prazo podem dar origem a um imenso parque temático. Ao aspecto mais “cartoon” acresce um realismo simples na apresentação, na passagem do tempo, na passagem do sol para a chuva, do fumo que sai pela chaminé, das luminosidades dentro da casa, mas um aspecto sempre “cute” que vai desde a apresentação de uma personagem e suas indumentárias até ao objecto com que decoramos o interior e contribui para o tornar eventualmente mais quente e acolhedor, num toque muito pessoal. É um bocado isto que faz a experiência de Animal Crossing soar diferente de outros simuladores sociais.

Uma nova vida na ilha

A chegada à ilha é só o ponto de partida para a grande aventura que ali terá lugar. A nossa ilha, a qual baptizamos e escolhemos a partir de um layout, está desabitada, mas revela alguns pormenores interessantes. Para começar, é maior que os espaços terrestres disponíveis nos jogos anteriores. Por outro lado, não está dividida, A diferença está na sua verticalidade e na sua natureza selvagem. Desde logo, de início é impossível percorrê-la na sua total extensão. As águas que descem do cimo impedem o acesso à outra margem. Só depois da criação de um conjunto de ferramentas (uma vara que nos deixa saltar e uma escada) é que podemos saltar para o outro lado e até escalar o topo. Nessa verticalidade, até a vegetação é diferenciada. No cimo da ilha, as árvores são diferentes e encontramos lindas flores que podendo ser transplantadas para outro ponto, também servem de adereços e peças decorativas interiores ou exteriores. Para isso teremos que dar uso a uma série de manuais DIY (Do it yourself).

2 A transformação dos cenários é completa

A vida na ilha após a chegada é feita a partir do zero. Aprenderemos a construir ferramentas indispensáveis para pescar, escavar, cortar lenha, num amplo trabalho de obtenção de matérias primas e transformação em objectos úteis de trabalho e peças de mobiliário ou decorativas, embora isto seja sintomático da série. Grande parte destes objectos são criados a partir de uma workshop instalada no serviço de residentes, gerido por Tom Nook. Mas se os passatempos como a pesca e os trabalhos como colheita dos frutos ou obtenção de lenha são indispensáveis para serem trocados, a ordem dos eventos diários está melhor estruturada em termos de produção.

Ao fim de algum tempo estamos a reservar o espaço para os novos residentes. A vida nas tendas confere uma ideia de acampamento e transitoriedade, que em tempo real se resume a não muito mais do que um par de dias se formos lestos. Depois de executadas algumas tarefas, indispensáveis à obtenção de recursos, é-nos dada a possibilidade de passar para uma casa, depois de feito um contrato de crédito com Tom Nook, sempre o financiador. O pagamento pode ser feito através de “bells” ou por via das milhas (miles).

Esperto é o Nook: Nookphone

O sistema de miles é uma novidade em New Horizons, e funciona como um conjunto de recompensas (em forma de milhas) por executarmos tarefas enquadradas na exploração da ilha. Basicamente, equivale a um largo tutorial sobre o que devemos fazer e que depois nos acompanha permanentemente. Enquanto que anteriormente nos poderíamos sentir algo perdidos sobre o rumo dentro do jogo, este jogo não só gratifica como abre uma ideia do que é relevante tendo em vista a melhoria e evolução da pequena comunidade. As milhas são inicialmente reduzidas mas suficientes para serem trocadas por coisas como acessórios de vestuário, peças de mobiliário e objectos de uso quotidiano, para ter dentro ou fora da casa. Aliás, é com milhas que pagamos a Tom Nook o “pack” de acesso à ilha.

3 Os residentes têm as suas casas, decorando os interiores e exteriores.

Do conjunto do pack faz parte o NookPhone, o telemóvel da nova geração que opera a entrada em Animal Crossing, servido por um conjunto de aplicativos, entre os quais as guias de construção das peças de mobiliário, de decoração e das ferramentas, bem como as milhas. Aliás, sempre que somos recompensados por alguma façanha, acedemos ao aplicativo que nos dá um elucidário das mais diversas tarefas sujeitas a recompensa. Isso torna o jogo muito mais esclarecedor e faz desaparecer a ideia mítica de que em Animal Crossing nos limitamos a regar as plantas e colher frutos das árvores. Algumas são de atribuição única, enquanto que outras são multiplicadas por quantidades maiores. Pode ser visto também como um sistema de “achievements”. A partir de uma fase no jogo, as recompensas sucedem-se e sempre que ficam activas uma luz e um som despertam no ecrã.

Por via dos manuais de construção (alguns chegam à ilha dentro de garrafas que dão à costa) passamos a fabricar imensos objectos, que vão desde peças de mobiliário, ferramentas, elementos de decoração. Este processo de fabrico torna tudo mais aliciante, porque não só confere importância à aquisição de matérias primas, principalmente através da madeira que podemos obter das árvores, mas também a partir das pedras. É realmente impressionante a vastidão de coisas que podemos produzir. Dessa forma conseguimos decorar com mais precisão e rigor o interior da nossa habitação. Esse também é um dos objectivos, decorar o interior com objectos e peças com as quais nos identificamos.

Importa de resto mencionar que muitos objectos podem ser adquiridos no serviço de residentes e na Cranny’s Nook. Aos objectos interiores acrescem as coisas que podemos utilizar no exterior, para montar um parque de diversões ou até um parque natural, com caminhos, fontes e bancos. Podemos até construir uma pequena casa para os passarinhos ou uma pequena estante onde se guardam livros para uma leitura ao fim do dia.

4 Os manuais DiY permitem uma variedade de coisas e ferramentas, criados a partir da workshop e das matérias-primas, recolhidas na ilha e em ilhas misteriosas.

Na ilha, ainda permanece muita da lide original. Capturar peixe rende uns trocos na troca comercial com Timmy e Tommy, mas podemos levá-los ao sábio Blathers que gere o museu. Há grandes aquários e até uma espécie de enciclopédia onde constam os peixes que descobrimos. Detalhes como a época do ano em que aparecem e características como tamanho e tipologia complementam o quadro. Aos peixes acrescem as borboletas, de diferentes espécies e não faltam os vestígios arqueológicos, recolhidos em pontos assinalados na terra. Há tesouros e brindes que chegam à ilha por via de um balão, podendo cair a partir do momento que rebentamos o balão com a nossa fisga. Ah, e desta vez as ferramentas básicas destroem-se ao fim de algum tempo de utilização. Para equipamento mais seguro terão de gastar mais matérias-primas.

O desenvolvimento primordial da ilha através do terraforming

A chegada de novos residentes, a relação comercial com as personagens e negócios na Cranny’s Nook tendem a operar modificações significativas na ilha. Os avanços na ilha dependem da nossa afectação. Com tempo poderemos montar diversas cercas, afastar as ervas daninhas e produzir belíssimos jardins. Podem cortar árvores colocadas em sítios menos oportunos para as plantarem onde melhor cabem (crescem em 4 dias). Claro que para as flores se manterem viçosas terão que as regar diariamente, mas importa sublinhar a quantidade de coisas que podemos usar para configurar a ilha. Nesse processo de transformação gradual, também os proprietários das lojas e até do serviço de residentes tendem a melhorar os espaços, inaugurando novas instalações e fazendo melhorias nas fachadas. Nas obras produzidas pela Nook Inc podemos ver o espaço reservado, com materiais e utensílios para a obra, e na véspera de abertura um toldo enorme cobre já o edifício. São detalhes como este que demonstram o cuidado e arranjo na apresentação.

A ferramenta primordial, que permite o desenvolvimento inteiro da ilha, é a licença com a qual passamos a poder abrir caminhos, mudar o curso de água, fazer rampas e acessos a áreas superiores, para além das pontes e outras construções de pedra, betão e tijolo. A quantidade de materiais que chegamos a dispor é realmente abissal. Só que, como disse atrás, nada disto é oferecido inicialmente. Teremos que recolher matérias primas e só depois de obtidos os avanços e conseguido uma margem de processo ficaremos habilitados a construir edifícios. É nesta fase que entramos no ponto alto do jogo, o momento de eleição a partir do qual chegam mais residentes e é permitida uma total definição da ilha ao nosso gosto. É a dimensão paisagística, que também resulta no interior das habitações, mas que funciona sobretudo no exterior, com uma quantidade enorme de manuais de fabrico de determinados objectos, que chegámos ao alcance máximo da evolução em New Horizons.

5 Timmy e Tommy dão as boas-vindas à Cranny’s Nook.

Nesse tempo de exploração e construção ocorrerão coisas insólitas, como um pelicano marujo naufragado que acaba por dar à consta insistentemente, pese todos os esforços para permanecer a bordo da embarcação. Acaba arrastado até à areia pela maré e o seu discurso é pouco coerente, para não dizer desconcertante. Haverá visitas de outras personagens, como o cão hippie Harvey, ele que também possui uma ilha para onde podem ir e tirar boas fotografias, dentro de vários cenários. O aeroporto garante a ligação a outras ilhas, algumas misteriosas, onde é possível obter matérias-primas e coisas que não existem na nossa. Com tempo acabam por encontrar velhas personagens e estreitar conhecimento com novos npc’s. Sem uma narrativa em moldes tradicionais, há espaço para reatar velhos comparsas e estabelecer novos vínculos.

Para um ou mais jogadores

A dimensão individual da experiência em New Horizons ainda é dominante. Podemos desenvolver a ilha e chegar ao ponto de desenvolvimento máximo sem mais jogadores. Mas é sempre interessante partilhar a experiência com outros, tanto a nível online como por ligação local. Assim, é possível que oito jogadores sejam residentes numa mesma ilha, embora até quatro possam jogar ao mesmo tempo e numa consola. Se tiverem duas consolas, ambos jogarão mais comodamente. Isto é interessante porque permite um progresso mais acentuado, repartindo tarefas. Em alternativa poderão convocar jogadores de outras ilhas e no serviço de residentes há uma caixa onde podem armazenar diferentes objectos, numa base de partilha.

6Com a licença terraforming é permitida ampla liberdade de construção.

Quer seja jogada “a solo” ou partilhada, a experiência em Animal Crossing tende a perdurar no tempo. Este é daqueles jogos que nos convida quase todo o ano. O acompanhamento em tempo real do relógio do jogo com o relógio da consola, activa não só as estações como os eventos maioritariamente celebrados no planeta. Pensamos no Natal, no nosso dia de aniversário, na passagem de ano. As estações ficam também marcadas pelo aspecto da ilha. Situada no hemisfério norte, não deixará de ter neve nos meses frios de inverno. Nesta altura, e com a chegada da primavera, há um tom azul e verde. A brisa produz movimentos nas folhas das árvores e o sol realça o colorido das habitações.

É um jogo muito “cute”, pleno de pequenos detalhes que tornam uma visita à casa dos residentes uma oportunidade para descobrir peças únicas e até um ambiente especial, como se a casa de cada residente fosse única. A propósito, a configuração do interior possui um editor bastante cómodo de arrumação. E tanto o piso como papel de parede e tapetes podem ser mudados com grande facilidade. A abertura e fecho de cada porta é acompanhada pelo som de um sininho. A juntar a isto há toda uma indumentária passível de edição, para quem não queira comprar roupas com motivos feitos.

Há uma harmonia, uma paz, uma atenção aos detalhes e um estilo de vida em AC New Horizons, que juntamente com as mudanças operadas ao nível da construção de edifícios e infra-estruturas, fazem deste o mais impressionante AC. Vemos nele influências de outros jogos do tipo “life sim”, mas consegue tocar no ponto diferenciador por todas as componentes que envolve, da socialização até à modelação ampla da ilha, das casas e seus interiores. É um jogo que consegue ser gigantesco sem se tornar complicado ou aborrecido. Ainda retoma boa parte do seu conteúdo original, a recolha de algumas matérias-primas pode tornar-se exasperante pelo limite diário, mas podemos sempre melhorar e desenvolver outras coisas enquanto esperamos. Há sempre uma surpresa nesta ilha.

Prós: Contras:
  • Ilha maior com dimensão vertical e horizontal
  • Construção alargada com criação de rampas, pontes, elevações e mudanças do curso do rio
  • Reforço na decoração dos interiores de um editor e perspectiva para melhor observação exterior.
  • Avassalador número de peças decorativas, mobiliário, vestuário e de diversões
  • Atenção ao detalhe e aspecto “cute”
  • Entrada de novas personagens conduz a ilhas misteriosas”
  • Modo multiplayer com uma ilha a juntar até 8 jogadores
  • Sistema de milhas permite melhor estrutura dos objectivos
  • É um jogo que se acompanha ao longo do ano
  • Limitações diárias na recolha de algumas matérias primas
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