Twin Mirror – Análise

A Dontnod Entertainment dispensa qualquer tipo de apresentação, principalmente para os fãs dos títulos comandados pela narrativa. Começando a sua travessia na indústria com Remember Me, em 2013, foi com o lançamento de Life is Strange que a companhia se destacou realmente, sendo para muitos um dos melhores jogos do género que até à data, era monopolizado pela Telltale Games, nomeadamente no terreno independente.

Aliás, apesar do lançamento de Vampyr, onde as expectativas eram altas, a companhia continua rotulada pelo excelente trabalho no título de 2015. Em 2020 colocaria dois jogos no mercado, o mais recente Twin Mirror, anunciado em 2018 e que chegaria em dezembro ao mercado. Este foi apresentado como um dos trabalhos mais “terra a terra” da companhia, onde o sobrenatural seria colocado de parte.

Para consegui-lo, o jogo leva-nos a uma pequena vila fictícia norte-americana, Basewood. Apesar de não existir no mapa, esta possui imensos elementos que caracterizam este tipo de localidades, nomeadamente as ruas, os bares, mas principalmente o ambiente social, onde as pessoas se conhecem perfeitamente, gostam de criar intrigas e, fundamentalmente, nunca se esquecem.

A principal motivação deste tipo de jogos é, sem margens para dúvidas, a narrativa, ao mesmo tempo que é entregue ao jogador grande parte do poder de decisão e desenvolvimento da mesma. Para tal, controlamos Sam, um jornalista de investigação que se vê forçado a voltar às raízes, mesmo que para isso tenha de colocar o passado para trás e enfrentar aquilo e aqueles que, a certa altura, o fizeram sofrer.

Não vou explorar o enredo do jogo a fundo, pois a possibilidade de estragar a experiência será enorme, vou referir apenas que esta é a história mais madura que a companhia alguma vez apresentou. Sam regressa a um local que lhe é bastante familiar para o funeral de um amigo, em tempos melhor amigo, e rapidamente se vê envolvido na investigação da sua morte, questionando a sua própria presença na cidade.

A primeira secção do jogo serve, principalmente, para contextualizar o jogador, seja nas personagens que acompanharão o normal desenvolvimento do enredo ou nas mecânicas do jogo. Neste último ponto, e apesar da Dontnod anunciar a ausência de elementos sobrenaturais, o jogador caminhará diversas vezes pela sua própria mente, local conhecido como Mind Palace, onde dará de caras com a sua voz interior, Double, onde somos confrontados com alguns dos tradicionais Quick Time Events (QTE).

É perfeitamente normal que esta fase inicial se revele um pouco “lenta,” desprendida de grande emoção, o que acaba por ser demasiado constante em Twin Mirror. Este primeiro ato não transmite relativamente nada ao jogador, o que provoca uma ausência de simpatia para com o protagonista ou qualquer outra personagem. Isto leva a que as primeiras decisões/escolhas, sejam desprovidas de contexto e até interesse.

Uma vez que este género capta e cativa milhões exatamente pelas escolhas e, por conseguinte, pela existência de múltiplos finais, seria imperial que todas as decisões importassem, ou seja, que pudéssemos estar desde o primeiro momento conectado com Sam, ou com qualquer outra figura para que, no mínimo, começássemos a delinear um caminho. E mesmo que a decisão tomada seja espontânea, essa acaba por acontecer num certo vazio.

E apesar de algumas coisas melhorarem com o decorrer do jogo e à media que chegam as revelações e a promessa de vários finais, Twin Mirror não tem presente a alma e emoção características da Dontnod. Ainda assim, e com uma boa banda sonora bastante (talvez o melhor elemento de todo o jogo), acaba por ser uma experiência competente, com uma duração de cerca de seis horas, caso não queiram explorar as múltiplas conclusões.

Twin Mirror é o jogo mais maduro e “terra a terra” da Dontnod, que explora conceitos profundos e a ambiguidade que está associada à nossa dualidade, envolvendo-nos simultaneamente numa história criminal. Ainda assim, não possui a magia e emoção da produtora, com personagens de interesse “q.b.” e uma história que vai melhorando com o tempo, à medida que novas variáveis e revelações entram em cena, mas que nunca chega a níveis de excelência.

Share