Pokémon Violet e Scarlet – Análise

Nascida no longíquo ano de 1996, a franquia de Pokémon começou por um singelo jogo para o Game Boy. Certamente poucos imaginavam que um quarto de século depois, se viesse a tornar num colosso cultural, com um império de jogos, filmes, séries, animações, cartas colecionáveis, linhas de roupa ou brinquedos, além de um lugar cativo no coração de todos os fãs, desde os mais pequenos aos mais graúdos.

O sucesso dos jogos Pokémon assenta numa fórmula clássica, que se manteve igual durante mais de uma década, mas que para todos os efeitos, já se começava a tornar algo monótona e de certa forma limitante, especialmente a nível criativo. Da mesma forma que a franquia de Pokémon transcendeu o seu formato original, Scarlet e Violet também querem transcender a sua fórmula em direção a um novo patamar.

Admirável mundo novo

Ainda que não seja um território totalmente novo, Scarlet & Violet são os primeiros jogos da franquia principal de Pokémon a optar por um mundo totalmente aberto. A experiência feita em Arceus foi bem recebida pelos fãs e agora a Game Freak quer repetir a façanha, aplicando o gameplay tradicional da série num mundo sem barreiras. A fusão nem sempre é bem sucedida, muito devido aos compromissos exigidos para criar esta nova fórmula.

Os primeiros momentos de Scarlet & Violet são tal e qual como qualquer outro jogo da franquia: Começamos na nossa casa e poucos momentos depois, é-nos dado a escolher um de três Pokémon para nos acompanhar na aventura. Segue-se uma introdução à narrativa do jogo, que para encaixar num esquema de mundo aberto nos concede uma tremenda liberdade – de facto, creio que apanhei cerca de 15 Pokémon só entre o tutorial e a chegada à Uva Academy, o ponto de partida das minhas aventuras.

Tipicamente, na franquia Pokémon as várias narrativas do jogo estão entrelaçadas, unidas por um fio condutor que guia os jogadores por um único caminho, desenrolando-se simultaneamente. Em Scarlet e Violet, temos três grandes aventuras narrativas para explorar, inicialmente independentes entre si, mas que culminam num arco que as une no final. Temos a já habitual marcha pelos ginásios da região, a luta contra a equipa Star, um grupo de adolescentes mal comportados com queda para o espetáculo e a busca pelas ervas míticas, guardadas por Pokémon Titãs.

Os combates são travados no mundo do jogo, sem sermos levados para uma arena imaginária.

Desde o primeiro momento que temos liberdade para explorar qualquer uma destas aventuras a nosso belo prazer, afinal, a região de Paldea está à espera de ser descoberta e não faltam segredos para descobrir e Pokémon para capturar. As diferentes zonas do mapa não têm qualquer tipo de escala de nível – em teoria nada nos impede de seguir em linha reta para as regiões mais distantes e desafiadoras, mas naturalmente somos rapidamente eliminados pelos Pokémon locais ou pelos treinadores, que pela primeira vez não nos desafiam para um combate assim que trocam um olhar connosco.

O mundo aberto é de facto uma lufada de ar fresco para a fórmula de Pokémon(…)

Em Violet, para atravessar a região temos a companhia do Pokémon lendário Miraidon desde os primeiros momentos de jogo. Este acaba não só por ser uma ferramenta muito útil para alcançar os locais mais difíceis e inacessíveis, especialmente depois de desbloquear algumas das suas habilidades, como também tem um importante papel narrativo no enredo do jogo. De facto, Miraidon acaba por ser mais crucial do que qualquer um dos outros Pokémon e senti-o mais como um companheiro de viagem do que como um acessório para ultrapassar um obstáculo, como muitas vezes aconteceu na história da franquia. (Quem é que não tinha um Pokémon só para os HMs?)

O mundo aberto é de facto uma lufada de ar fresco para a fórmula de Pokémon, especialmente para alguém como eu, que se perde muito facilmente à procura de todos os recantos, guiado por uma curiosidade sem fim. Infelizmente, toda esta liberdade cobra o seu preço.

Barreiras invisíveis

A má performance de Scarlet e Violet na Nintendo Switch foi o compromisso assumido pela Game Freak. É difícil dizer se é um caso de má otimização ou se estamos perante os limites do hardware da Nintendo Switch, mas a verdade é que o jogo raramente conseguiu manter uma framerate estável de 30 frames por segundo. Esta situação agrava-se especialmente em zonas com chuva, tempestades de areia ou perto da água, e chega a ser dolorosa quando encontramos um Pokémon Tera (já lá vamos) numa destas situações.

Texturas com baixa resolução, pop-in constante, sombras que desaparecem: O mundo de Pokémon ameaça tornar-se demasiado grande para a Nintendo Switch.

Devia estar um treinador a segurar naquela bola – um dos muitos exemplos da performance do jogo.

Ainda que não estivesse à procura de uma performance gráfica de assinalar, os jogadores que coloquem um maior peso na componente visual podem ter aqui uma espinha considerável.

Novo mundo, novos truques

Como não poderia deixar de ser, há muitas novidades em Scarlet e Violet que vão para lá do mundo aberto. Uma delas é o modo “Let’s Go,” que basicamente permite enviar um dos nossos Pokémon para o terreno, onde luta automaticamente contra os Pokémon selvagens e ainda apanha itens. Estas lutas são rápidas e automáticas, e naturalmente dão menos pontos de experiência.

Ainda assim, não deixam de ser uma boa forma para acumular materiais e experiência, a passo que as batalhas normais seguem a fórmula tradicional. Isto também ajuda a fortalecer a ideia de um mundo vivo e orgânico, onde a ação se desenrola toda no mesmo plano.

Neste campo, a maior novidade é o Terastal – um fenómeno que permite aos Pokémon assumir uma forma cristalizada, que altera o seu elemento. O nome pode ser complicado, mas a mecânica é simples. Para além dos seus elementos normais, os Pokémon têm um elemento Tera, que assumem quando se transformam. Na maior parte dos casos, o elemento Tera é igual ao elemento base, mas alguns Pokémon especiais assumem um elemento diferente, o que abre estratégias para os combates mais difíceis.

Terastal – um fenómeno que permite aos Pokémon assumir uma forma cristalizada, que altera o seu elemento.

Os Pokémon especiais com elementos Tera diferentes podem ser capturados em Raid Battles, onde até quatro jogadores se podem juntar. Quem joga sozinho, é acompanhado de três NPCs. Nestas batalhas a chave passa pela coordenação e escolha dos momentos certos para jogar ao ataque ou à defesa. É através destas lutas que por exemplo apanhei um Pokémon do tipo Fairy e Steel, capaz de assumir o elemento de Poison no formato Tera.

Podem parecer assustadores, mas os Pokémons Tera são relativamente fáceis de derrotar.

Em termos práticos, raramente tive de utilizar esta mecânica para bater os meus adversários. Na maior parte do jogo, os combates não exigem estratégias particularmente complicadas. No entanto, para os jogadores mais competitivos e que combatem entre si, o Terastal pode abrir as portas a novas manobras, capazes de revolucionar o meta dos combates de forma inesperada. Os jogadores competitivos também vão ter uma margem de manobra considerável, com acesso a itens que permitem melhorar e alterar todos os parâmetros dos seus Pokémon favoritos. Desde as habilidades até à sua personalidade.

Os colecionadores peritos em ‘minmaxing’, também vão poder organizar piqueniques, onde para além de poderem fazer sandes que lhes garantem buffs, também vão receber ovos, caso tenham Pokémon compatíveis. A verdade é que esta mecânica me passou ao lado, e nunca senti que estava a perder algo de muito valioso, mais uma vez, dirige-se mais para quem quer caçar os míticos Pokémon ‘Shiny’ ou criar uma criatura absolutamente perfeita.

Finalmente, e não querendo alargar-me em demasia ou estragar surpresas a alguém, o enredo de Scarlet e Violet é algo expectável de um jogo Pokémon. Ingênuo e ternurento, tenta surpreender com alguns plot-twists, descaradamente evidentes mas completamente inofensivos. Aqui, a Team Star sai a ganhar muito graças ao design dos seus personagens, completamente estrambólico e divertido. Acreditem, ainda não viram nada até verem Pokémon que parece uma combinação de um carro alegórico do Carnaval do Rio e um camião de Mad Max.

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