Captain Tsubasa: Rise of New Champions – Análise

Vivemos num país onde o desporto rei é uma doença, o “ópio do povo” como dizem. Com o passar dos anos fui dando menos importância à modalidade, mas em jovem era completamente obcecado por Futebol, tomava banho aos domingos na condição de ver o Domingo Desportivo até ao final, seguia e regozijava com as vitórias do meu cube (não interessa!) e vi tudo aquilo que o canal público nos deu da série animada Captain Tsubasa, durante os anos 90.

O impacto foi grande, a única vez na vida que sonhei ser guarda-redes, culpa de Genzo Wakabayashi, que anos mais tarde a dobragem teve a audácia de baptizar de Benji — “Quem é o Benji?” Perguntava ao meu irmão, já nos anos de reemissão da série com o título ‘Campeões: Oliver e Benji ‘. O guarda-redes era uma visão terrível para qualquer avançado, era impossível batê-lo com um remate de fora da área, pelo menos era essa a sua lenda, que viria a ser colocada em causa pelos restantes protagonistas, começado por Tsubasa Ozora.

Esse mesmo sentimento é transposto para Captain Tsubasa: Rise of New Champions, jogo desenvolvido pelo estúdio Tamsoft, com que tenho andado envolvido nos últimos dias, agora de modo mais pacífico, mas inicialmente com muitos palavrões à mistura. Vocês sabem… lag. O anúncio da adaptação da série captou a atenção de milhares de fãs, que ainda hoje brincam com muitos dos momentos que Captain Tsubasa tornou cliché, como o facto de demorar uma eternidade a chegar de um lado ao outro do campo, ou de ser possível tabelar nos postes para efectuar defesas de sonho.

O jogo respeita, tanto quanto possível, as características do anime, e por isso desenganem-se se estiverem à espera de um tradicional simulador do desporto. Mesmo títulos claramente arcade, como Virtua Striker, estão muito distantes de Captain Tsubasa. Tentei jogá-lo como um tradicional jogo de futebol, procurando espaço nos flancos, dar as costas ao oponente, esperar a subida das linhas, falhei miseravelmente. A única utilidade que retirei da literacia passada foi a capacidade de acompanhar as posições no mini-mapa e a utilização do 1-touch pass para triangulações, tudo o resto é mais Street Fighter do que futebol.

Esqueçam as faltas, uma investida em carrinho ou um encontrão vai retirar a bola do oponente independentemente de o efectuarem num perfeito slide lateral ou com uma entrada a rasgar o tendão de Aquiles pelas costas. A violência é tão gratuita e visual como o anime o permite, sendo que para evitá-la, terão de procurar acertar no tipo de corte do oponente, acelerando em drible diagonal no momento certo, ou com uma finta também bem temporizada. É uma questão de escolher o input certo na hora exata.

É possível desenvolver padrões de sucesso depois de alguma habituação, mas a ação é francamente rápida e exige atenção, sendo divertida enquanto não se esgota o factor novidade. E era mesmo verdade, pode demorar uma eternidade a atravessar o terreno de jogo em corrida, para isso o estúdio de desenvolvimento não só fez o rectângulo de jogo maior, como trabalhou as animações dos jogadores de forma a transmitir a ideia de corrida desenfreada, quando na realidade os atletas estão a bater em velocidades de maratonista.

era verdade, pode demorar uma eternidade a atravessar o terreno de jogo…

A classe tem pouco espaço em Captain Tsubasa: Rise of New Champions, com os super-guarda-redes torna-se praticamente impossível marcar golo enquanto a sua barra de spirit estiver bem preenchida, recurso que é aliás condição para praticamente todos os movimentos do jogo, a sua gestão é a chave do sucesso. É necessário massacrar o guarda-redes até que um remate especial o obrigue a largar a bola, ou pior, o atire para dentro da baliza com ela. Muitos dos remates e jogadas espetaculares que se lembrarão do anime, estão presentes, o seu impacto é que vai perdendo relevância com a passagem do tempo e repetição.

A inteligência artificial também está longe de merecer destaque, o modelo de troca de jogadores não ajuda e para um jogo que explora uma narrativa tão assente no dramatismo associado ao futebol e às lesões que vêm com a alta competição, não existirem faltas torna tudo um caos absoluto. Por um lado é “bola cá, bola lá,” por outro é imprevisível, as poucas bolas paradas resumem-se aos pontapé de baliza, lançamentos e raros foras e jogo, os colegas são demasiado lerdos para se desmarcarem quando era suposto.

Grande parte da experiência single-player assenta em duas campanhas robustas (“The Journey”), a primeira segue a história de Tsubasa até à final contra Hyuga em jogos onde momentos marcantes do anime nos são impostos, como o raio dos gémeos dentuças e a sua cabeçada mortal, e uma segunda campanha onde vão passar mais tempo (“New Hero”), que nos convida a criar um jogador que podemos ir melhorando com os jogos e umas cartas que cheiram a microtransações, mas que felizmente se mantêm disponíveis apenas dentro do espectro da unidade monetária do jogo. Entre jogos e vários segmentos animados, é agradável atravessar ambos os modos, mas apenas depois de se habituarem ao modelo e aceitarem que isto não é exatamente um jogo de futebol. Gostava de ter continuado a jornada de Tsubasa, capítulo que o jogo sugere estar agendado para mais tarde, provavelmente em forma de conteúdo adicional.

Esgotadas as aventuras a solo, o caminho é o Online Versus, onde com uma equipa personalizada, enfrentamos jogadores de todo o mundo em partidas rápidas em busca da ascensão de divisões. Este é, espera a Bandai Namco, o cerne da experiência de Rise of New Champions, começamos na liga Rookie, primeiro em frente ao CPU, e vamos conquistando níveis defendendo o nosso escudo, melhorando o custo da equipa e com isso enfrentando jogadores mais capazes. Além das cartas de treino, são muitas as opções de personalização, sinceramente bem mais do que esperava, de modo a permitir imprimir realmente o nosso cunho ao plantel que levamos para os confrontos internacionais.

Não é fácil aconselhar Captain Tsubasa: Rise of New Champions a quem não for um confesso fã da série animada japonesa, vai contra quase tudo o que conhecemos do funcionamento de um videojogo de futebol, mas isso é simultaneamente o seu ponto forte. No fim do dia vão ver e fazer coisas que nunca tinham experimentado, num modelo estranhamente divertido e provavelmente a mais competente forma de cumprir a fantasia de jogar ao lado de Tsubasa Ozora ou Kojiro Hyuga, efetuando combos desafiadores da motricidade humana e remates capazes de rebentar uma bola de futebol no embate com o poste.

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