FIFA 22: Passado, presente e futuro do FIFA Ultimate Team

Hoje pode parecer evidente, mas em tempos era difícil imaginar como a mistura de cartas colecionáveis, ao estilo Magic the Gathering, com a simulação de futebol, introduzida pela Electronic Arts no longínquo ‘UEFA Champions League 2006–2007’, iria resultar no mais famoso modo de jogo da história de FIFA, quem sabe mesmo do gaming moderno.

O lançamento do Ultimate Team no FIFA 09 foi cuidadoso, talvez por ser um modo demasiado ambicioso e que afinal, estava a dar os primeiros passos. Apresentado como um DLC pago, acabou por ter uma adesão surpreendente, pelo menos a julgar pelos problemas registados nos servidores, que não suportavam o nível de tráfego. Foi um claro indicador do que estava para vir, um mapa para o futuro de um género onde, francamente, não é fácil inovar.

Avançando mais de uma década, o Ultimate Team tornou-se não só no modo mais popular do jogo, como é também a principal fonte de rendimento da EA Sports de ano para ano, superando em muito a venda da caixa a preço novidade. De acordo com o último formulário 10-k, o Ultimate Team valeu à editora uma receita de cerca de $7 mil milhões desde 2015, sendo que esse valor tem registado um crescimento constante ao longo do tempo:

Porque o Ultimate Team é tão apelativo?

Comecemos pela simulação, obviamente é de FIFA que estamos a falar, são séries de partidas de futebol, disputadas com o máximo de rapidez para manter as sessões curtas e o envolvimento constante. Aqui há ainda a competitividade a considerar, porque, por mais desafiante que seja a inteligência artificial, não há nada mais gratificante do que vencer outros humanos, impor as nossas capacidades perante semelhantes, especialmente se tiverem melhores equipas.

Além da habilidade exigida para ser competente com a bola virtual nos pés, o FUT envolve ainda um planeamento estratégico muito gratificante se usado corretamente. Grande parte do nosso sucesso depende de uma gestão eficiente das cartas de jogadores e, consequentemente, das nossas formações. Depois, ainda há a questão dos contratos para ter em conta, mas concentremo-nos nos incrementos diretos.

Temos dois indicadores numéricos a considerar para determinar a qualidade potencial da equipa: A química e a classificação (nível) do plantel. A química é basicamente o nível de entrosamento de um jogador com os demais, influenciado pela sua nacionalidade e equipa atual no futebol real. Já o nível do plantel é basicamente a média do rating dos jogadores em campo e sentados no banco. Estes dois indicadores são os principais impulsionadores do contínuo investimento dos jogadores, seja com dinheiro real para adquirir FIFA Points, ou através do seu próprio tempo de jogo, ao procurar conquistar recompensas nas diferentes competições.

(…) nada mais gratificante do que impor as nossas capacidades perante semelhantes…

São imensos os vetores de progressão aliados ao FUT, um “truque” clássico dos bons jogos ou modos online, para que não seja possível aos jogadores ficarem com aquela sensação de que “fizeram tudo o que é necessário”. Há sempre mais alguma coisa.

Temos então a classificação do plantel, que nos permite comparar a nossa equipa com as restantes, o Season Level, o FUT Champions Rank, o Squad Battles Ranking ou o Division Rivals, que foi redesenhado esta temporada, uma série de opções para todos os tipos de jogadores, que garantem o envolvimento contínuo com o modo, sempre com a promessa de recompensas no horizonte.

Modelo de financiamento final ou em mutação?

Como qualquer ambiente online financiado por DLC, microtransações, etc, o Ultimate Team precisa de uma grande base de jogadores para prosperar verdadeiramente. É do interesse da EA que o máximo de pessoas tenham o FIFA mais atual nas suas máquinas de jogo, por isso vemos o simulador figurar em tantas campanhas de desconto ao longo do ano.

Facilmente argumentamos que seria uma boa ideia para a EA disponibilizar gratuitamente cada novo FIFA, há cada vez mais utilizadores que encaram o modo online competitivamente, que investem milhares de euros para ter uma equipa verdadeiramente capaz. O que a editora faz, inteligentemente, é acrescentar diferentes extras, como FIFA Points, às edições, mitigando o investimento na caixa e promovendo, adivinharam, o Ultimate Team.

FIFA Points (Preços)

Recentemente, e com a ajuda de dois jogadores profissionais, montámos duas equipas competentes e acessíveis à maioria dos bolsos. Também já analisamos as possíveis estratégias e as melhores edições para vos ajudar a jogar competitivamente. No entanto, a verdade é que de ano para ano, e principalmente com o crescimento do modo, é cada vez mais complicado ser bom sem investir euros adicionais.

Desde FIFA 09 que o modo tem sido avesso a inovações ou alterações mais arrojadas. A EA mantém as coisas interessantes graças a uma sublime apresentação, música, interface ou a forma como o modo está integrado com o futebol real, mas a química, fitness, as training cards, contratos, coins, estádios, entre muitas outras coisas, já existiam há 10 anos atrás.

O poder da aleatoriedade

Na base da monetização de FIFA está a venda dos famosos FUT Packs, que podem ser adquiridos na loja online ou conquistados como recompensa. Além dos packs normais, existem ainda packs promocionais e especiais, disponíveis periodicamente. Neles os jogadores encontram as cartas, que podem ser jogadores de diferentes raridades, diferentes tipos de unidade monetária, cosméticos e/ou consumíveis.

O poder que essa aleatoriedade tem nos nossos cérebros está simultaneamente na base do sucesso, mas também das críticas, pela comparação com gambling, de que o modo de jogo é alvo. É obviamente extremamente recompensador abrir packs, milhares de produtores de conteúdo ganharam nome no mercado por se dedicarem a jogar a a abrir estas carteirinhas, que estão na gênese da decisão de diferentes países em proibir, ou limitar o FUT. Foi isso mesmo que motivou a inclusão de uma mecânica em FIFA 21, que a cada 24 horas, permite que possamos espreitar os conteúdos de um pack antes de comprá-lo.

EA esforça-se por manter as coisas frescas, introduzindo novos tipos de carta…

Já que um reset é inevitável de época para época, a EA esforça-se por manter as coisas frescas, introduzindo novos tipos de carta em cada edição. Aproveitando a atual popularidade dos heróis dos comics, FIFA 22 dá as boas vindas às Hero Cards, versões especiais de jogadores que apesar de nunca terem alcançado o estatuto de ícone, tornaram-se especialmente populares com os apaixonados do desporto, num determinado momento ou local.

Esses foram agora incluídos no FIFA Ultimate Team como Heroes (heróis), estando disponíveis em versões únicas para cada jogador. O seu comportamento é similar aos Icons, mas além do bónus de química com outros jogadores, estão também associados à liga onde jogaram, devendo ser colocados lado-a-lado com outros competidores dessa competição. Podem conferir a lista na galeria de seguida (via EA).

Possibilidades para o futuro do FUT

Com as receitas do FIFA Ultimate Team a crescer como um relógio, não é de crer que a EA deixe de afinar e otimizar o funcionamento do modo para garantir um futuro de [ainda] maior sucesso, justiça e claro, competitividade entre os jogadores. Há muito que pode ser feito, mas entre as principais preocupações da editora estará a problemática do alegado gambling, que está no cerne das críticas ao FUT.

O modo é quase ofensivamente bem montado para gerar lucro…

Independentemente de onde nos colocamos na discussão, duas coisas são inegáveis. 1. O modo é quase ofensivamente bem montado para gerar lucro, e 2. O jogo tornou-se demasiado dependente, monetariamente, da venda de FIFA Points. A EA tem procurado diversificar o sistema de financiamento com a introdução de novo modos dentro do FUT, mas pode ir mais longe, com um tipo de monetização que seja menos dependente das funcionalidades “gacha“.

Estamos a pensar em algo do género do que faz Fortnite com o Crew: um tipo de pagamento recorrente que, mesmo que não garanta aos jogadores o acesso aos melhores itens e jogadores do planeta, lhes permita o acesso a diferentes recompensas mais facilmente, uma equipa base ou até itens exclusivos, basicamente um modo de recompensar pagamentos recorrentes, reconhecer o tempo e dinheiro investido no jogo ao longo do tempo, sem colocar em causa a base de participação em cada época.

Outra inclusão que tem sido pedida pelos mais dedicados é uma forma de recompensar os investimentos de elevada dimensão. O tradicional neste género de aleatoriedade nos videojogos é garantir, por exemplo, um item de determinada raridade (mínimo) depois de abrir X packs, 10, 20, 30 imaginemos. Porque sim, os deuses da sorte não tratam todas as pessoas por igual, e parece-nos uma funcionalidade que funcionaria bem em FIFA.

Não faltam participantes para que a EA possa facilmente sondar as vontades da comunidade de modo a tentar perceber o que podia ou não funcionar sem colocar em causa a rentabilidade do modo de jogo, é verdade que financeiramente, não há grande incentivo para uma mudança drástica, mas flexibilidade seria a forma perfeita para a editora demonstrar boa vontade, até porque a confiar nas notícias e no fim da relação com a Federation Internationale de Football Association, a EA vai ter uns “cobres” extra para investir.


Antigo residente de Azeroth, mudou-se para o mundo real para poder escrever sobre as coisas que o apaixonam. Desconfia-se sonhar ser super-vilão. Podes segui-lo em @Darthyo.

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