The Incredibles 2: Os Super-Heróis – Análise

Filmes de super-heróis? Ou melhor, franchises de filmes de super-heróis? A Pixar demonstra uma vez mais, como há catorze anos atrás, todo o seu génio criativo ao devolver em formato de animação aquilo que muitos blockbusters tentam em vão. Sim, The Incredibles 2 – Os Super-Heróis é seguramente, e com mérito próprio, um dos melhores filmes de super-heróis do ano. Take that, Marvel!

É quase impossível ignorar a nostalgia de quem viu o original The Incredibles – Os Super-Heróis, em 2004, até aqueles que tinham na altura, digamos três anos, e descobriram pela primeira vez esta família com super-poderes. Seja o vertiginoso Flecha ou o Sr. Incrível, mesmo que na sua linguagem infantil lhes saísse apenas “Sr. Inquível”. É que mesmo esses que terão hoje em dia dezasseis anos, dificilmente sairão defraudados com este regresso da Família Pêra (ou Parr, apesar da versão dobrada continuar a ser genial). Sim, vocês sabem quem são.

O novo filme até começa onde o anterior terminou, ou seja, numa sequência monumental, a invejar os filmes de super-heróis de imagem real, em confronto devastador com o Underminer em que os Incríveis a agir em família conseguem evitar o pior, ainda que não os estragos maiores na cidade, pelos quais serão responsabilizados e relegados para um motel em prisão domiciliária. Uma vez mais, a classe fica ameaçada e socialmente arredada, um pouco como sucedeu naquele que é, talvez, o melhor filme de super-heróis de sempre, The Watchmen, de Zach Sneyder, de 2009, e que parece ter aqui uma agradável referência.

um dos melhores filmes de super-heróis do ano. Take that, Marvel!

A ajuda chegará através dos irmãos Winston (Bob Odenkirk) e Evelyn (Catherine Keener) e a companhia Devtech propondo-lhes um regresso à atividade e a habitar uma casa de sonho, muito parecida com a de um tal Homem de Ferro. A única condição dessa mudança é que seja a Mulher Elástica (Holly Hunter) a assumir o protagonismo, já que o seu registo de estragos era manifestamente inferior ao do mais brutal Sr. Incrível (Craig. T. Nelson), relegado a ficar em casa a tratar dos filhos – seja a ajudar Flecha (Huckleberry Milner) na matemática, a mostrar confiança a Violeta (Sarah Vowell) e até a lidar com os novos poderes do Zezé (Eli Fucile). Oportunidade então para o brilho feminino, talvez aqui a auscultar o momento atual de empoderamento do sexo (dito) fraco e naquilo que tem de melhor.

O que importa salientar é que o mérito continua a ser aquele que sempre se revelou mais frutuoso. Ou seja, encarar um projeto com uma verdadeira obra de arte e apostar numa riqueza narrativa em detrimento do espalhafato dos efeitos especiais que apenas enchem o olho e nos esvaziam a alma. Disso saberá bem Brad Bird, autor de ambos os projetos e capaz de traduzir e sintetizar grande parte do imaginário anterior da Pixar, fundindo da melhor maneira o ambiente sitcom familiar com os deveres desta classe à parte.

A novidade é o cuidado em imprimir ao filme alguma atualidade, seja ao celebrar essa capacidade feminina numa referência velada ao próprio movimento #MeToo, mas também até alguma subtileza ao introduzir no discurso elementos de regresso aos bons velhos tempos, como o slogan vamos tornar os super-heróis grandes de novo, que pode ser encarado com uma paródia com ecos políticos

E vilões, temos? Sim, depois do Síndrome chega-nos a ameaça de Screenslaver, um misterioso hacker que se esconde atrás de uma máscara e que consegue subjugar os super-heróis através dos ecrãs e monitores, no que parece ser também uma mensagem subtil à nossa dependência dos ecrãs. Aliás, essa proximidade ao real e a inúmeras referências é um dos pontos de força deste filme. Desde a piscadela de olho às sequências iniciais que ainda é imagem de marca da saga 007, replicada no início do filme, até à humanização desta super-família e na exploração eficaz de cada um dos seus poderes.

No entanto, há um elemento do agregado Pêra que merece maior relevo. Trata-se de Zézé, que nos oferece agora alguns dos momentos mais hilariantes pela diversidade dos seus poderes especiais. Já agora, uma palavrinha à regressada Edna Moda (com a voz do próprio Brad Bird), responsável pelo guarda roupa especial dos Pêra.

Como se esperava, o filme combina bem o luxo das sequências de ação com uma narrativa que evita estereótipos, ao mesmo tempo que recorda até o lado mais vintage do género, algo que tantos filmes de imagem real parecem ser incapazes de superar. Razão pela qual estes Incríveis 2 conseguem manter a qualidade do original ou até mesmo superá-la. Um trunfo enorme para a Pixar e para a animação digital. Algo que consegue até, por momentos, ao refrescar a narrativa com elementos contemporâneos. Como que a dizer-nos que as sequelas são bem-vindas, sobretudo quando atravessam o género e mantêm viva a sua frescura narrativa.

Veredito

Mesmo com 14 anos de distância, sente-se uma proximidade enorme entre esta sequela com o original. Pelo meio, celebram-se as geniais personagens de capacidades super como poucos filmes de imagem real souberam fazer. Sem perder a noção do espetáculo e da força de uma narrativa com que dificilmente deixaremos de nos identificar.

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