The Dark Pictures Anthology: House of Ashes – Análise

“A tua sobrevivência depende das escolhas que fizeres. Estas funcionarão como uma bússola, guiando-te através do desconhecido. Vais encontrar o caminho para a salvação? Ou perderes-te para sempre?”


House of Ashes é o terceiro jogo da série The Dark Pictures Anthology – esta conhecida pelo terror cinematográfico, narrativas independentes, em que as decisões do jogador determinam os acontecimentos e a história.

Em House of Ashes recuamos até ao ano de 2003, onde a guerra no Iraque – ainda que perto do fim – é iminente na sombra da Cordilheira de Zagros. Uma unidade militar, acompanhada pela agente de campo da CIA, Rachel King, tem ordens para investigar as suspeitas de uma instalação subterrânea de armas químicas.

“Durante o confronto entre as duas forças, um tremor de terra abre enormes buracos no solo, fazendo ambas cair para as ruínas de um templo sumério soterrado e, na escuridão debaixo do Deserto da Arábia, algo malévolo desperta. Selvagem e imparável, um ninho de criaturas ancestrais e sobrenaturais tem uma nova presa para caçar.”

Em House of Ashes prepara-te para vestir a pele dos dois grupos oponentes e, em aproximadamente 6 horas, postergar a linha que define todas as diferenças – desde a língua, aos emblemas da farda – e unifica uma espécie que, em tempos de puro desespero e medo, é definida pela sua resiliência e instinto de sobrevivência.

Será que cada um deles vai priorizar a sua própria sobrevivência ou será que vão pôr os seus medos e rivalidades pessoais de lado para se unirem e lutarem juntos? Depende de ti…

“Inimigo do meu inimigo é meu amigo”

House of Ashes é um jogo que vem marcar a rivalidade existente na raça humana e demonstrar o quão volátil é a linha que, tanto separa, como nos aproxima, em tempos de maior dificuldade. Quando um mal maior se aproxima, o instinto animal que possuímos obriga-nos a trabalhar em equipa, abdicando de egos e despindo a alma de preconceitos. Vemos isto, pela primeira vez, em House of Ashes, no ano de 2231 a.c, em Akkad, do Império Acádio – numa época onde práticas bárbaras predominavam e os direitos humanos eram inexistentes. Quando nas profundezas do solo são descobertas criaturas malévolas, os dois rivais unem-se e perpetuam a icónica frase que marca a história de The Dark Pictures Anthology: House of Ashes “Inimigo do meu inimigo é meu amigo”. A máquina do tempo segue caminho e a narrativa cruza a história, o ciclo volta a repetir-se, numa altura em que a amizade entre os EUA e o Iraque era impossível.

Triângulo amoroso

House of Ashes possui algo de inédito na franquia e que é extremamente importante para nós jogadores: a exploração da relação entre personagens. Quando jogamos um jogo, queremos conhecer as personagens a um nível mais íntimo, conhecer as suas rotinas, ao ponto de sentir compaixão ou até mesmo repugnância (dependendo dos casos). Aliás, isto é aquilo que torna os videojogos num forte contributo ao nosso desenvolvimento, onde os nossos sentimentos/ emoções e princípios/ valores são explorados e postos à prova, tal como acontece num bom filme ou livro. Mas isso… já são “outros quinhentos”.

Em House of Ashes a exploração de personagens é-nos imposta por um triângulo amoroso. O General Eric King e a agente de campo da CIA, Rachel King, são casados, mas vivem separados. Durante a separação, Rachel acaba por se envolver com o Sargento Nick Kay e eis que as três personagens são destacadas para integrar a equipa a pisar o solo iraquiano.

Enquanto jogadores, vamos ter nas nossas mãos o poder de decidir se Rachel King opta por Eric ou por Nick, assim como em Life is Strange: True Colors escolhemos se Alex deve ficar com Ryan ou com Steph. É claro que estas escolhas têm consequências e, num jogo de terror, onde a luta pela sobrevivência é constante, todas as decisões vão definir o desfecho das personagens.

Ainda assim, senti que as relações podiam ter sido mais aprofundadas na narrativa do jogo. É certo que detemos informações sobre o passado de Eric e Rachel King, mas ficou a faltar algum background para as restantes protagonistas. Por exemplo, senti que, na pele de Salim – o soldado iraquiano – eu não tinha uma ligação propriamente forte que me fizesse priorizar a vida da personagem. Se mais alguns detalhes sobre a vida de Salim tivessem sido revelados, talvez tivesse nutrido algum sentimento pelo soldado, ao ponto de salvá-lo (ou pelo menos tentar).

American Horror Story

The Dark Pictures Anthology tem uma pegada bem marcada na indústria dos videojogos, em diferentes aspetos, mas este especialmente: reciclagem de personagens. Esta característica assemelha-se à série televisiva American Horror Story (por exemplo). Nova temporada -> nova história -> as mesmas personagens. Por um lado, leva-nos a pensar que a Supermassive Games quis cortar nos gastos de produção, por outro… talvez seja uma estratégia para vincar ainda mais a sua identidade e aquilo que define a assinatura da série. Os fãs da franquia sabem o que podem esperar de um novo The Dark Pictures Anthology e isso leva-os ao entusiasmo, começando a projetar (precocemente) aquelas personagens em múltiplos cenários. É como se existissem várias linhas temporais que unissem as mesmas caras, mas encarnando pessoas diferentes.

Ainda assim, contamos com adições ao elenco, como é o caso das personagens principais Rachel King (Ashley Tisdale), Eric King (Alex Gravenstein), Nick Kay (Moe Jeudy-Lamour), Jason Kolchek (Paul Zinno) e Salim Othman (Nick Tarabay).

Em House of Ashes terás que fazer os possíveis para que estas personagens consigam todas abandonar as ruínas do templo sumério… com vida. No meio de tantas rivalidades, indiferenças e desilusões, nunca te esqueças que “o inimigo do meu inimigo é meu amigo.”

Curador

Se existe personagem intrigante em The Dark Pictures Anthology é o Curador. É-nos apresentado em Man of Medan, acompanha-nos em Little Hope e agora, dá-nos as boas-vindas a mais uma aventura memorável em House of Ashes. Esta personagem é tão icónica na série que a sua primeira aparição, ao som da famosa “A Conversation With Death”, em House of Ashes nos faz entrar, automaticamente, no mundo Dark Pictures. Ainda sem saber o que esperar, desfrutamos da sua ilustre entrada, até à primeira interação.

Em House of Ashes, mais uma vez, o Curador mostra-se disponível para nos dar pistas, ainda que isso não revele um ato de bondade. O Curador torna a nossa experiência real, ao falar diretamente para nós – jogadores – e não para uma personagem. House of Ashes é-nos apresentado como mais uma experiência curta, mas intensa. Até agora aquela que, verdadeiramente, conta uma história sobre amigos e inimigos, lealdade e traição, vida e morte.

A Descida ft. Van Helsing

House of Ashes é uma importante marca na série The Dark Pictures Anthology, já que depois de Until Dawn, nenhum outro da Supermassive Games surpreendeu os fãs, pelo menos da mesma forma. Em House of Ashes voltamos a sentir fortes momentos de tensão, envolvidos num ambiente completamente caótico onde o medo, aflição e pânico são apenas uma parte da equação. Na outra parcela, temos a vontade insana de sobreviver, sentimos o que as personagens sentem, num cenário completamente claustrofóbico, misterioso e aterrorizador. Assim que caí para as ruínas do templo sumério, lembrei-me automaticamente do filme “A Descida”, onde as personagens são guiadas por um campo de visão minúsculo, enquanto caminham entre as paredes apertadas da caverna.

Tudo isto aumenta a sensação de medo, principalmente quando viramos a esquina e, possivelmente, o que nos espera é uma criatura horripilante pronta a matar-nos (jumpscare!). Em House of Ashes, as criaturas estão incrivelmente bem desenhadas e apresentam uma visão dos Vampiros que só vimos, outrora, no famoso filme Van Helsing. A Supermassive é perita neste tipo de sustos, também proporcionados pela combo incrível entre a escuridão, luz situacional, sombras, vultos, mistérios e uma banda-sonora que produz um efeito imediato em nós: carregar mais rápido nos botões.

Nota: Aconselho vivamente a jogarem HoA na versão PC ou em consolas next-gen, já que na PlayStation 4, tive alguns erros e bugs que, apesar de não terem afetado a progressão no jogo, quebraram a experiência e imersão em momentos imperativos.

The Dark Pictures Anthology: House of Ashes veio revolucionar a franquia com aquilo que os seus antecessores não ofereceram. Não só cumpre os requisitos imperativos para um bom jogo de terror/ horror, como ainda divulga uma mensagem implícita que só está ao alcance dos mais resilientes que se permitiram passar pela superação do medo, em autênticos testes de pressão e escolhas. Num cenário completamente obscuro, onde nada se vê, mas tudo se sente, as decisões têm de ser feitas e o rumo da história será mudado… para sempre. House of Ashes é, sem dúvida, o melhor jogo da série até agora.

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