Rune Factory 5 – Análise

Rune Factory 5 é a mais recente entrada numa longa linha de jogos, composta por 16 anos de História e sete títulos lançados até agora (oito com este). Toda esta bagagem pode, com legitimidade, assustar os interessados em dar os primeiros passos na franquia. Mesmo tendo um grande gosto e ligação por mecânicas de crafting/simulators e ainda uma maior ligação com RPGs no geral, sempre senti receio de molhar os pés nesta franquia quando me deparava com a sua considerável dimensão.

Há, no entanto, bastantes características que o posicionam como uma boa porta de entrada para novos jogadores – pelo menos é essa a impressão que deixou a alguém que nunca jogou um Rune Factory e que tem alguma experiência com RPGs –, nomeadamente: é o primeiro Rune Factory da linha principal a ser produzido para uma consola doméstica (embora a Switch seja híbrida), com estética e gameplay assentes em 3D, distanciando-se bastante de todos os anteriores; é o primeiro Rune Factory a explorar mais afincadamente a fusão dos vários géneros acima mencionados; e tem uma narrativa totalmente independente dos restantes (com alusões familiares para os fãs, sem barreiras para novos jogadores).

(…) o primeiro Rune Factory da linha principal a ser produzido para uma consola doméstica, com estética e gameplay assentes em 3D…

Para além disso, e tão ou mais importante, está estruturado para ensinar de forma gradual e orgânica todas as mecânicas presentes no jogo, através de sidequests e pontos de informação que podem ser acedidos em várias partes do mapa. Evidentemente, tendo em conta que estás a dar os primeiros passos num jogo que alia mecânicas de crafting, mecânicas de farming sims e ainda mecânicas de um RPG de ação, tens de estar pronto para uma primeira introdução longa, que te obriga a fazer algumas tarefas “básicas”, partindo do princípio que tens zero conhecimento destes géneros.

Passada esta primeira horita de despejo de informação, que apesar de parecer muita é na verdade reduzida face ao que fica por ensinar e explicar, correspondendo apenas a uns 5% de informação, tudo o resto é organizado em três possibilidades de aprenderes esta informação:

  1. Autodidata: conforme vais avançando no jogo e vais experimentando por iniciativa todas as coisas, vais aprendendo sobre elas;
  2. Sidequests: uma boa parte destas “missões” estão desenhadas para te ensinar os básicos de muita coisa. As quests secundárias em Rune Factory 5, sobretudo as primeiras, não são apenas missões chatas para encher conteúdo, têm propósito;
  3. Pontos de informação: existem muitos locais que te dão informações aprofundadas sobre imensos detalhes com que os conhecedores da franquia não precisam de perder tempo e que dão jeito a quem nunca jogou (farming, missões principais, sistema de combate, monstros de estimação, barras de energia, locais de armazenamento, crafting, sistema de socialização e por aí fora).

Rune Factory 5 arranca como todos os anteriores: o protagonista acorda amnésico, num local que desconhece. Não sabe quem é, de onde vem, nem como ali chegou. Estas questões rapidamente se tornam irrelevantes face a um pedido de socorro de uma menina, que nos leva a combater um monstro, protegendo-a da morte certa. Saímos vitoriosos do combate mas esgotados, acabando por desmaiar. Acordamos pouco depois na cidade mais próxima, Rigbarth.

Somos muito bem recebidos pelos residentes, especialmente pela médica/cientista e chefe de Rigbarth, que nos convida a ficar por ali a viver e a trabalhar, pelo menos até as memórias regressarem. Para tal, ingressamos na SEED, uma organização mundial, com filial sediada naquela cidade, que tem como objetivo protegê-la dos monstros que habitam nas redondezas, bem como estudar e proteger o mundo de anomalias relacionadas com a energia que faz parte de todas as coisas, designada por Rune.

A história principal, que pode ser terminada em 30h/40h de jogo, se não fizeres grandes desvios, anda à volta disto e pouco mais. É descomplicada, sem grande desenvolvimento ou originalidade. Por um lado os fãs de RPG irão achá-la básica e estereotipada, por outro, acaba por ser um bom ponto de partida para quem não está familiarizado com as narrativas básicas de um título deste género, situadas num mundo de fantasia: existem anomalias com a energia que governa o mundo, que por sua vez estão a criar perturbações nos ecossistemas, os monstros estão com comportamentos estranhos e existem pessoas com más intenções que se querem aproveitar da situação. As tuas missões principais na SEED andarão à volta de investigar as razões por detrás destes acontecimentos, entrar em dungeons onde decorre determinada anomalia, derrotar o Boss da dungeon e reportar a informação de volta à base (não avanço mais que isto para evitar spoilers).

O desinteresse que a banalidade da narrativa poderá causar nos jogadores mais experientes de RPG, ou até naqueles que procuram aqui uma boa história, é compensado por todo o sistema de crafting e farming que parcialmente a alimenta. Em Rune Factory 5 existem 4 profissões principais: forging (armas e utensílios de agricultura), crafting (armaduras e acessórios), chemistry (medicamentos, antídotos, etc) e cooking (comida que serve também para te curares ou melhorares o teu stats). Antes de exercer cada uma destas profissões tens de passar num exame e tirar a licença. Assim que tiveres a tua licença, podes comprar a mesa adequada no carpinteiro da cidade, para começares a praticar e a evoluir na tua profissão.

Para exerceres qualquer uma destas profissões (ou todas se assim o desejares) precisas de duas coisas essenciais: matéria-prima (pedras, cobre, metal, cristais, madeira, ervas, etc) e dinheiro (para poderes comprar utensílios necessários à profissão). A matéria-prima pode ser recolhida pelo mundo fora, que podes explorar livremente. O dinheiro é obtido através de missões terminadas com sucesso ou das vendas que realizas. Podes vender qualquer produto que obtenhas ou que produzas. Uma das formas mais lucrativas é o farming, que é basicamente toda uma outra profissão. Tens de realizar todos os processos que compõem a agricultura e depois podes vender tudo o que produzires.

Como na maior parte dos títulos deste género, o jogo está estruturado por dias de 24H (cada dia demora aproximadamente 50 minutos em tempo real). Nestas 24h tens de planear muito bem a tua rotina para que seja o mais rentabilizada e produtiva possível. E é assim que se estabelece um ciclo aliciante e viciante.

O dinheiro obtido na agricultura pode ser investido nas tuas profissões. As tuas profissões ajudam-te a produzir melhores utensílios para criares uma agricultura ainda mais produtiva. Com mais dinheiro podes investir, por exemplo, na criação de melhores armas, melhores armaduras, melhores poções, melhores roupas, que por sua vez te ajudarão a passar o modo de história com recurso a diversas coisas que foste tu que criaste com o teu sangue, suor e lágrimas. Dei por mim a investir dias em farming e forging só para criar uma espada, para depois a poder usar contra um Boss. A satisfação que sentes de cada vez que consegues derrotar um Boss com recurso a itens que passaste dias a trabalhar para obter, é viciante. E depois queres ir para o próximo Boss, mas antes há que semear mais vegetais para vender, para investir em melhor forging, para criar uma espada ainda mais forte (e quem diz espada, diz outras armas como lanças ou sabres, cada uma com estilo de luta diferente).


Continua…

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