Advance Wars 1+2: Re-Boot Camp – Análise

As minhas primeiras impressões de Advance Wars 1+2: Re-Boot Camp, baseadas em apenas algumas horas de jogo do modo campanha, foram as de estar a jogar um título com mecânicas datadas vestidas com gráficos mais bonitos.

A intenção de um remake é precisamente essa, a de refazer a estética de um jogo por inteiro, preservando todas as suas engrenagens. À medida que passei mais tempo no jogo, e, sobretudo, avancei na campanha, o meu receio confirmou-se: o remake não é a abordagem que o meu fã interior de Advance Wars desejava.

Já explico. Antes disso, talvez seja melhor falar um bocadinho do que é Advance Wars 1+2: Re-Boot Camp e de que se trata Advance Wars no geral.

Advance Wars é um jogo de estratégia por turnos, no qual assumes o papel de um comandante de um batalhão pertencente à Orange Star, a fação protagonista do jogo. O mundo está dividido em diversas fações, que detêm determinados territórios, pelo que, de forma muito simples, o teu objetivo será derrotar todas as fações e conquistar, a pouco e pouco, os seus territórios.

O campo de batalha é estruturado num grid system, muito semelhante a um jogo de xadrez (sendo que a diferença está na oferta de mais de uma centena de tabuleiros diferentes), no qual poderás mover diversas peças até atingir o cheque-mate. Cada peça tem características específicas, quer seja no ataque, na defesa, ou na quantidade de casas que se pode mover. Quanto ao cheque-mate, geralmente pode ser atingido de duas formas: destruindo todas as peças do teu inimigo, ou conquistando a sua base central.

Cada campo de batalha também tem características muito próprias, sendo que os mais complexos forçar-te-ão a batalhas na terra, no mar e no ar, obrigando a fazer uso das duas dezenas de peças diferentes. Deixando aqui um exemplo: uma das peças ao teu dispor é a Infantaria, uma unidade de exército que se desloca a pé, portanto o número de casas que pode avançar é limitado relativamente a, por exemplo, um helicóptero ou submarino, duas das peças com maior alcance de locomoção do jogo. A Infantaria apresenta das defesas e ataques mais baixos, mas são cruciais para conquistar os territórios. É essa a sua grande habilidade, até porque quase nenhuma peça do jogo o poderá fazer.

Os campos mais complexos adicionam algumas variáveis muito importantes: fábricas de produção, portos marítimos, aeroportos e economia. O número de cidades conquistadas reflete-se proporcionalmente na tua economia, uma variável que aumenta a cada turno. Essa economia poderá então ser posteriormente utilizada para produzir as peças que mencionei acima, através das fábricas de produção, portos marítimos e aeroportos.

Por fim, mas não menos importante, temos as habilidades especiais dos Comandantes Operacionais, que são as personagens que escolhemos antes de cada batalha. Estas habilidades embora se conheçam de antemão, introduzem um grau de imprevisibilidade na estratégia geral, pois nunca sabemos quando serão utilizadas. Há, por exemplo, uma personagem que tem a habilidade especial de criar uma tempestade de neve que afeta apenas a locomoção do inimigo. A desvantagem criada, nem que seja por um turno, utilizada no momento certo, poderá mudar por completo a direção do jogo.

Temos, portanto, uma recriação de toda a estratégia militar que uma guerra envolve, mas em jogo de tabuleiro.

Fine tuning complete.

Todas estas mecânicas são os pilares de Advance Wars, são elas que fazem de Advance Wars algo único e foram todas preservadas. Então, porque tenho um problema com o facto de ser um remake?

Enquanto remake, Advance Wars 1+2: Re-Boot Camp cumpre o que promete e a mais não é obrigado. A minha crítica não é ao remake em si, que está muito bem concretizado por sinal. É antes à escolha, à abordagem. Ou seja, não senti que o remake tenha sido a melhor escolha. Há mais de 20 anos, quando o primeiro Advance Wars foi lançado, fiquei maravilhado com a premissa e execução. Fosse pela campanha, fosse pelo grafismo a puxar por tudo o que a Game Advance podia dar, fosse pela possibilidade de jogar com amigos. A par de Pokémon, é provavelmente o jogo no qual investi mais horas. Conheço-o relativamente bem, especialmente as mecânicas de jogo e os mapas da campanha. E, tal como eu, muita gente.

Daí surge o meu maior problema: a dificuldade do jogo e a forma como é criada. Sendo um remake, o jogo desenvolve-se praticamente – e digo praticamente porque já lá vão 22 anos e a memória falha – da mesma forma como se desenvolveu no original. A dificuldade do jogo é a mesma. As adversidades são as mesmas. O desafio é reduzido.

Há duas décadas, uma época subdesenvolvida no que à inteligência artificial diz respeito, os jogos eram desenhados para dar a ideia de que estávamos a combater uma inteligência artificial verdadeiramente inteligente. No entanto, e por detrás disso, existia na verdade uma inteligência programada. Muitas vezes colocados em cenários de desvantagem sem nos apercebermos – seja numérica, seja por condições atmosféricas ou do campo de batalha – que efetivamente deixam o jogo mais complicado, mas não estamos perante uma Inteligência Artificial que reage às nossas estratégias.

O facto de ser remake é a desculpa para preservar estas características, que são lindas e maravilhosas em retro, mas que se transformam em desafios pouco orgânicos, sobretudo se já forem veteranos do jogo. A “Inteligência Artificial” não reage aos diferentes movimentos que fazemos, tudo se desenrola mais ou menos da mesma forma, seja qual for o vosso movimento ou escolha tática, pelo que a dificuldade está apenas na surpresa e no desconhecimento de cada campo. Basta perderem uma ou duas vezes e rapidamente conseguem vencer o inimigo. Para além disso, não importam as vezes que recomecem o nível, as peças do inimigo encontram-se exatamente no mesmo local. Portanto, sejam ou não bons no jogo, por tentativa e erro vão vencer.

Talvez aqui seja a minha expectativa de veterano de Advance Wars a pesar, mas, efetivamente, e desde que foi anunciado, senti que esta era a oportunidade para modernizar por completo um dos jogos mais importantes do RPG tático, mas falhou precisamente na parte que mais podia ser aproveitada pelas tecnologias modernas.

Numa era de Inteligência Artificial avançada, com algoritmos capazes de derrotar até os melhores jogadores de Xadrez do mundo, numa era de moda de roguelites e roguelikes, com as suas dungeons geradas dinamicamente, pensei que ia combater em campos que mudam a cada entrada, que a IA escolheria novas posições para as suas peças, evitando ser derrotada por mera tentativa e erro.

Mas…! E é um grande ‘mas’, o remake introduz uma componente que não apenas salva os seus próprios defeitos, como os colmata por completo.

A qualidade máxima do Advance Wars original é a sua capacidade multiplayer, onde um, ou mais jogadores humanos ocupam o lugar de adversário, substituindo as batalhas pré-feitas da “inteligência artificial”, colocando à prova a nossa astúcia e conhecimento. A virtude do original repete-se no remake, desta vez melhorada, modernizada e acomodada às exigências dos jogadores e plataformas atuais, acrescentando-lhe a componente online – esta vai ser a minha perdição.

A campanha, apesar de aborrecida e pouco desafiante, acaba por servir de treinador, que nos ensina a desenvencilhar das mais desvantajosas situações; um calo e aprendizagem indispensáveis para nos preparar melhor para as derradeiras batalhas contra os nossos amigos e agora, graças ao online, contra desconhecidos de qualquer parte do mundo.

Os gráficos lindíssimos, com uma escolha estética semelhante ao que foi feito com The Legend of Zelda: Link’s Awakening; a banda sonora e sound design nostálgicos, que preservam todas as tonalidades do original; as animações de cada batalha, os designs e animações dos Comandantes de Operações (agora com direito a dobragem); e um adversário humano à altura do outro lado… é esta a conjugação que eleva este remake a masterpiece no que diz respeito a jogos de estratégia.

As melhorias de quality of life, como desligar as animações de cada movimento são muito bem-vindas, já que era algo que rapidamente se tornava repetitivo e prolongava uma batalha mais do que o necessário. São alguns segundos de cada vez, mas são segundos que acontecem várias vezes ao longo de uma batalha, transformando-se em minutos desnecessários num jogo de estratégia que já por si pode demorar muito tempo.

 

Contas feitas, continuo a achar que na melhor das hipóteses a escolha mais interessante seria um reboot e que a ideal seria um remaster (com melhorias de quality of life e adição da componente online, claro).

Recebo-o de braços abertos e os argumentos para ser comprado não são poucos. Os gráficos aprimorados e a dificuldade contida são uma bonita forma de introduzir novas gerações de jogadores aos RPG táticos em geral, e à franquia de Advance Wars em particular. Visualizo até veteranos da franquia a usá-lo como desculpa para introduzir os filhos a algo que lhes foi tão querido noutra época.

Além disso, os veteranos têm aqui uma oportunidade para adicionar os dois primeiros Advance Wars às prateleiras da coleção: dois dos jogos mais cobiçados, raros e cada vez mais desproporcionalmente caros do mundo do retrogaming.

Advance Wars 1+2: Re-Boot Camp é uma oportunidade que nunca pensei receber para ter uma cópia física de um dos jogos mais importantes da minha infância.

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